sexta-feira, 14 de maio de 2010

Para conter alta da inflação, um corte de R$ 10 bilhões


O governo vai jogar “um pouco de água fria na fervura” e cortar cerca de R$ 10 bilhões do Orçamento em gastos de custeio para que a economia não cresça demais, disse quinta-feira, em São Paulo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

– Chegamos à conclusão que devemos fazer uma redução de R$ 10 bilhões, além do contingenciamento que já tínhamos feito. Somando isso, dá mais ou menos 1% do PIB (Produto Interno Bruto). Consideramos que essa soma é suficiente para fazer o efeito anticíclico que queremos – disse Mantega.

Segundo o ministro, o bloqueio ainda será submetido à apreciação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o decreto, detalhando a contenção por ministérios, deverá sair somente no fim deste mês.

– Queremos conversar com os ministros antes de divulgar o corte por ministérios – disse Mantega.

Em março, o governo já havia anunciado o contingenciamento (bloqueio de utilização) de R$ 21,8 bilhões do Orçamento.

Segundo Mantega, investimentos e programas sociais serão preservados.

– Estamos avaliando se a demanda brasileira está acima do normal ou acima de um crescimento em torno dos 6% – disse mais cedo, antes de reunião com o ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, Paulo Bernardo, em que o corte foi discutido.

– A demanda nacional é composta de demanda privada e demanda pública. Então, a melhor maneira de jogar um pouco de água fria na fervura é diminuir os gastos de custeio do governo – disse o ministro.

Segundo Mantega, o governo terá um papel anticíclico para não permitir um crescimento de 7% da economia neste ano, porque pode aumentar juros, diminuir gastos e reduzir investimentos.

– A economia está aquecida, não está superaquecida, a gente tem que observar. Tem gente falando que o PIB está com 7,5 % de crescimento. Não acredito nisso – declarou o ministro.

Mesmo admitindo que no primeiro trimestre a economia cresceu a uma taxa anualizada de 8%, impulsionada pelos estímulos do governo, Mantega destacou que logo após se iniciou uma leve desaceleração e que o governo tem instrumentos para mantê-la crescendo de forma sustentada, sem excessos de demanda que poderiam acelerar a inflação.

Preocupação

O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse que ficou preocupado porque esta é a primeira vez que o governo faz um novo corte do Orçamento depois do contingenciamento de início de ano.

– Normalmente, a gente faz um contingenciamento grande o suficiente, e depois vamos fazendo liberações. (Mas) nós nos convencemos de que era importante também ajudar com a política fiscal – disse.

O relatório com a revisão orçamentária será apresentado ao Congresso no dia 20 e, segundo Bernardo, os cortes não serão lineares entre os ministérios.

– A vantagem do contingenciamento para combater a inflação é que se faz na veia, porque se tira a disponibilidade o ministério fazer o gasto – disse Bernardo. – A elevação da taxa de juro demora a fazer efeito, porque, até desestimular o investimento, até a fábrica interromper aquilo que está fazendo, passam quatro, cinco, seis meses.

O economista-chefe do Santander, Alexandre Schwartsman, avaliou que o corte parece razoável. “Mas para o grau de aceleração da economia tendo a imaginar que seja pouco”.


Ano eleitoral dificulta contenção de gastos, dizem especialistas

Num ano eleitoral, a política econômica torna-se refém do processo político, e isto dificulta a execução de contenções de despesas contra um aquecimento da economia, segundo especialistas consultados pelo Jornal do Brasil.

O corte, que segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, seria de R$ 10 bilhões, para ser efetivo, deveria ocorrer na área de investimentos, que no ano passado mobilizaram R$ 28 bilhões do caixa do governo federal, no entender do economista especializado em contas públicas Raul Velloso.

O especialista diz que as despesas de custeio referem-se mais a gastos com manutenção, que, pelo orçamento da União, representam 0,4% do Produto Interno Bruto do país, hoje na faixa de R$ 3 trilhões. Assim, o total da rubrica seria de R$ 12 bilhões, volume que não acomodaria o tamanho dos cortes anunciados pelo Ministério da Fazenda, explica Raul Velloso. Onde, então, o governo poderia cortar despesas?

Para o economista, a possibilidade de corte existe em investimentos já programados para setores que tenham menor capacidade de pressão.

– Isto, só o governo pode explicar e identificar. Não podemos esquecer que toda a lógica do processo, agora, prende-se à eleição – diz Velloso.

No mesmo sentido manifesta-se Ruy Quintans, economista e professor do Ibmec. Para ele, o anúncio da intenção de corte de despesas de custeio é medida que tem nexo com a política de contração fiscal destinada a evitar aceleração da inflação. Mas classifica a intenção como quase inócua, diante do fato de que, para manter superávit primário o governo central – que gasta mais de 90% do que arrecada – lança mais papéis da dívida pública, que terão maior custo de carregamento devido à elevação dos juros pelo BC.

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse quinta-feira que as críticas de que o Brasil teria “os maiores juros do mundo refletem um discurso fácil de que a trajetória do dólar frente à moeda brasileira seria sempre cadente”.

– Os críticos não avaliaram a sério o alerta de que diversas causas influenciam a taxa de câmbio, como aversão ao risco internacional, fluxo de capitais, preços de commodities e, no médio prazo, a evolução da conta corrente – disse Meirelles.

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